E quando você tem um dia ruim?

Você olha a internet. Facebook. Instagram. As pessoas celebram a corrida matinal ou mais um dia fechado com sucesso. O cansaço de um dia cheio de trabalho é exaltado. Metas cumpridas, sorrisos alegres, finais de semana na praia ou na balada.

Você acorda cedo. Sua cabeça está doendo. Ou você tem uma crise de ansiedade. Talvez seja um dia em que a depressão bateu mais forte. Ou você simplesmente não dormiu bem. Ontem você se lembrou de que faria um ano da morte de alguém querido. Hoje você não está bem para trabalhar. É dia de semana. Você queria era mais tempo de cama. Você toma seu analgésico, quem sabe. Recupera-se de leve. Você vê o sol brilhando e só fica pensando no calor do ônibus lotado. Você está de mau humor. E o dia passa como se não valesse a pena. Como se você estivesse carregando pedras enormes até o alto de uma montanha e elas rolassem morro abaixo e você tivesse que empurrá-las de novo. Isso é mitológico. Sísifo, castigado por Zeus na mitologia grega, passava por isso. Isso pode ser uma metáfora para um dia ruim. Ou para vários dias ruins. Continue lendo

Reconhecendo seus próprios limites

E então você sofre um acidente e precisa parar de trabalhar por um tempo. Ou então é a própria exaustão que lhe gera uma crise emocional e você demanda um afastamento de suas atividades. Mas você não quer parar. Você tem medo. Medo de perder o reconhecimento, o lugar, a potência. O medo da invalidez – temporária ou permanente – acompanha-nos como o medo da morte, mas não de maneira idêntica. Há quem diga, por exemplo, que não teme tanto a ideia de morrer, mas se angustia com a ideia de ficar dependente e dar trabalho aos outros. Aquilo que nos faz parar, “dar trabalho”, precisar de colo, depender de apoio às vezes parece insuportável. É uma ferida em nossa ideia de perfeição e de potência. É um reconhecimento – muitas vezes doloroso – dos limites da vida.

A doença, no corpo ou na alma, muitas vezes aparece como forma de mostrar o limite. As dores, as ansiedades, as depressões exigem pausas, mais longas ou mais curtas, e fazem com que precisemos pedir ajuda. Não apenas profissional, mas também de familiares e amigos. Nesses casos, aprendemos a formar redes e a reconhecer a importância dos laços. A parar aquilo que sempre nos pareceu natural de fazer e repousar o coração. Continue lendo

Se você tem depressão…

De acordo com informações da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) em 2018, estima-se que em todo o mundo 300 milhões de pessoas sofram de depressão. O transtorno é a principal causa de incapacidade em todo o mundo e contribui de forma importante para a carga global de doenças. A depressão é determinada por uma interação de fatores psicológicos, sociais e biológicos, sendo uma condição que demanda suporte de profissionais de saúde mental e de uma boa rede social de apoio para a pessoa que sofre.

Se você recebeu o diagnóstico de depressão ou apresenta sintomas como humor deprimido, perda de interesse em atividades que lhe costumavam parecer simples, perda de energia e redução do prazer no cotidiano, diminuição geral no desempenho nas atividades do dia-a-dia, desejo de morrer ou pensamentos de tirar a própria vida, saiba que você não está só. E não se culpe. Se você tem depressão, a primeira coisa a fazer é não se culpar. Antes, respeite e escute o seu corpo para saber como pedir ajuda. Sempre há alguém com quem conversar. Se você tem depressão, não faça silêncio. Fale. Conte a um familiar, a um amigo. Se você for adolescente, pode procurar o orientador de sua escola. Peça ajuda para procurar apoio profissional se você não conseguir fazer sozinho. Mas procure apoio profissional. Continue lendo

Produzir sentidos: um jeito de ser o que se é

É possível – e comum – nos dias atuais que sejamos tomados por um vazio de sentido. Ansiosos ou deprimidos, tomados pelo medo da perda de um emprego ou de alguém amado, sufocados por questões de trabalho ou financeiras, dominados por um tempo que não nos permite respiros ou mergulhados no nada do tempo sem desejo, perguntamo-nos: o que pode produzir sentido em nossas vidas? Talvez a resposta para isso esteja sempre em construção: ela está exatamente onde se para o pensamento e se dá início à ação – mesmo que a ação seja a produção de novos pensamentos, como quando começamos um curso diferentes ou produzimos um artigo.

Produzir sentidos é dar pequenos passos rumo ao que se é. Por isso, frequentemente vejo como é bonito quando alguém que há muito tempo não conseguia sair de casa acaba por marcar um café com uma amiga. Parece algo simples, mas é ação. Ação poderosa rumo ao que se é. Essa pessoa restabelece laços, mais do que com a amiga: ela os recria consigo mesma. Da mesma forma, iniciar uma dança, uma caminhada, um bailar rumo ao trabalho de outra forma: tudo isso pode produzir novos sentidos no trajeto. Escrever um poema, ouvir uma música, tocar um instrumento. Vestir-se de modo diferente – mesmo que sutil – e admirar-se no espelho. Continue lendo

Carta aos jovens: como lidar com um amigo em sofrimento

Este texto é especialmente dedicado a adolescentes e jovens, mas espero que possa ajudar também qualquer pessoa que tenha um familiar ou amigo que possa estar passando por depressão, ansiedade ou ideações suicidas. Não pretendo apresentar uma fórmula pronta – elas não existem – mas convidar ao diálogo.

Querido jovem,

Nos últimos tempos o seriado “13 Reasons Why” (Os 13 porquês) vem fazendo sucesso especialmente entre adolescentes. Ele conta a história de Hannah Baker, uma adolescente que passou por várias situações de bullying, assédio, machismo e violência sexual até chegar ao ponto de cometer suicídio. Ela, então, grava fitas contando quais foram as 13 razões que a levaram a tal ato. O seriado está na segunda temporada, que ainda não assisti. Sobre a primeira temporada, fiz muitas reflexões, inclusive com amigos de profissão, e hoje posso dizer que vejo dois problemas muito fortes: Continue lendo

“De como lidar com…” ou O cuidado com os processos de adoecimento emocional

Há uma variedade de mensagens e textos pelas redes sociais explicando “como lidar com alguém depressivo” ou “como lidar com alguém ansioso”. Com algumas dicas, muitas vezes em listas, todos esses textos fazem um importante apelo: “por favor, não julgue”! Reflito, pois, sobre o que vem acontecendo e o que vem produzindo a necessidade de mensagens assim. O quanto estamos julgando as pessoas pelos seus processos de adoecimento psíquico – ou mesmo períodos não patológicos de luto e tristeza – , como se a melhora dependesse unicamente de simples mudanças de hábito ou da vontade individual? Como se a melhora fosse e tivesse que ser rápida: “sei, sei que você está sofrendo, mas já faz muito tempo, não?” Quem determina o tempo? E qual o tempo de cada um? De tanto correr, o quanto nos atropelamos? De tanto correr, o quanto não olhamos para o outro?

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