De ser simplesmente humano: quando a gente tropeça no autocuidado

Há alguns dias escrevi um post com pequenas dicas sobre o que fazer em tempos de pandemia. Mantenho-as como válidas e importantes – você pode ir lá e olhar. Mas nada como o tempo para nos ensinar a desaprender as coisas e reaprender outras. Como psicóloga, como humana, como mulher de 36 anos, nunca vivi algo semelhante ao que estamos vivendo agora. Creio que isso é novo para todos nós. E, diante do novo, precisamos encontrar formas de nos reinventar. Como? Não sei dizer ao certo. Tenho aprendido com cada paciente, cada pessoa querida, cada depoimento que leio e escuto. Tenho aprendido comigo.

Este é um post íntimo de uma psicóloga que diz: eu não sei. E a gente não precisa saber. A gente vai descobrindo. Pode ser que você aprecie a solidão ou a própria companhia. Pode ser que você precise encontrar formas diferentes de contato – e a internet nos ajuda nisso. Pode ser que você descubra um talento novo ou se redescubra naquilo que parecia desconhecido. E pode ser que você tropece nisso. E não saiba mais o que fazer.

Eu lhe digo, então: está tudo bem tropeçar. Está tudo bem você ficar confuso com as notícias e querer fechar os olhos e apenas dormir. Desde que não se afunde nisso, permita-se às vezes sentir a dor. O mundo dói na gente. Mais em uns do que em outros. De jeitos diferentes. Uma foto que sem querer passa na tela de nosso celular pode derrubar nosso dia. Uma outra pode nos animar. A varanda ou o quintal de casa podem ser pequenas saídas para o mundo exterior. Um pouco de sol em meio aos tropeços.

E você pode querer arrumar tudo toda hora. E desinfetar tudo toda hora. Ou de repente se cansar disso. Se seu coração estiver confuso, está tudo bem. A gente não sabe bem o que fazer. Ninguém de nós. A gente se escuta e se conforta. E se você não conseguir fazer yoga, você pode dançar. Se você não conseguir dançar, você pode ouvir música. Se você não conseguir ouvir música, você pode escrever. Ou pintar. Ou gritar. Você pode gritar.

Você pode gritar!

Qual o grito que se esconde em você? De raiva, dor, medo, angústia? Saudades de uma vida que ficou guardadinha em tempos de quarentena – e que você tem medo de que nunca mais volte. Você quer aquilo que era antes. E você faz o luto do que não sabe bem o que é.

E você às vezes sai de casa. Porque precisa. Fazer compras ou trabalhar. Eu não posso lhe dizer para não ter medo. Eu não posso exigir nada de você. Ninguém pode. Mas a gente pode acolher o medo. A gente pode conversar o medo. A gente pode chorar o medo com amigos queridos. Com nossos amores.

A gente pode conversar a raiva e pode falar da culpa de ter tropeçado. E entender que a culpabilização individual não leva a nada. A gente não precisa ser produtivo o tempo inteiro. A gente não precisa dar conta do sentimento do mundo – o sentimento da pandemia – o tempo inteiro.

A gente pode ter um coração humano. Um coração que canta e que chora. Um coração que bate de saudades e faz um telefonema. Manda uma mensagem. Reencontra o passado. Acredita em futuros. Mesmo que às vezes não.

Passadas as ondas do tropeço, a gente se levanta. E a gente entende que a gente não produziu ou não foi zen ou não sentiu paz. E está tudo bem. A gente é gente. A gente é gente. A gente é gente.

A gente pode gritar!

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