O tempo é um senhor muito sábio. o grande mestre da cura. Ele nos faz atentar para o fato de que, no que se refere aos nossos modos se sentir e vivenciar a realidade, nem o “para sempre” nem o “nunca mais” podem ser pensados de forma rígida. Em constante movimento, a vida mostra que aquela dor não será eterna – assim como também não o será a alegria dos bons momentos.
É verdade, sim, que aquilo que morre jamais retorna da mesma forma. Coisas, ideias, paixões, momentos e também pessoas queridas. No entanto, fragmentos de memória sempre reinventam significados para aquilo que partiu: a memória existe no corpo fazendo com que a existência passada se presentifique a cada saudade. Nova, refeita, construída a partir do hoje: a lembrança guarda em nós aqueles que amamos, a viagem inesquecível, os tempos de sofrimento aos quais sobrevivemos firmes.
É importante deixar marcado, no entanto, que o tempo – sábio como é – não nos carrega nos braços enquanto, adormecidos, aguardamos um futuro mais doce em que a dor não é mais “para sempre” e as boas memórias amenizam o “nunca mais”. Não. O tempo nos quer cientes do processo, presentes na caminhada, sentindo os passos e os tropeços, ainda que nos permita, de quando em quando, algum cochilo.
O tempo é um sábio senhor que nos quer senhores e senhoras de nossas estradas. Ele se oferece a cada um conforme suas possibilidades. Ele não exige de nós uma pressa maior do que podemos suportar, mas também sabe nos empurrar quando nos é possível ir mais além. Ele nos acompanha no processo de cicatrização das feridas. Faz doer forte às vezes, pois coloca o passado em seu devido lugar. E quando a gente tenta pegar o futuro pelo rabo, ele ensina que não, não é bem assim: ele pede tempo.
Dar tempo ao tempo é permitir que ele prepare a cura. Da alquimia do tempo, pouco sabemos. Podemos, no entanto, dar uma ajudinha: podemos arrumar nossas gavetas dizendo adeus ao que já não nos cabe, fazer um uso prazeroso das horas, pegar no sono quando o cansaço não nos permite qualquer ação; podemos chorar até parecer que secamos, dar ao amor novos destinos, escrever uma carta, ler um livro; podemos vasculhar memórias e encontrar nelas traços de doçura, criar outros modos de dizer adeus, pedir um colo, um cheiro, um beijo.
O tempo, ele se encarrega de curar. Mas nós precisamos fazer parte do processo.
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